"Não, obrigado, estou
só olhando as páginas"
Mayra Corrêa e Castro

Já é metade de janeiro. Então, aproveito a data para recordar algo que talvez ainda esteja fresco na memória da gente: as compras de final de ano.
Você sabe do que estou falando: compras no supermercado por causa das ceias e no shopping, por causa dos presentes. Natal é uma época em que não se tem muita escolha. A gente entra numa loja e, devido à pressa, acaba levando o que o vendedor recomenda ou o que está no estoque.
Mas tente comprar alguma coisa agora que está mais relaxado. A experiência será bem diferente.
Primeiro: você terá tempo para fuçar ou só sair às compras quando realmente estiver com paciência.
Segundo: você vai pesquisar, vai bater perna antes de se decidir por algo. É claro que, se for comprar uma pasta de dente, não haverá maiores dramas de consciência. Mas qualquer comprinha acima dos 100 Reais já o faria pensar um pouco mais, não?


Quando ficamos indecisos sobre o que quer comprar - ou mesmo sobre se estamos realmente a fim de comprar, o quê não importa - normalmente entramos numa loja e ficamos olhando. Vai passear no shopping, dá uma voltinha pelo calçadão. Entra numa loja, sai, entra em outra...

Daí, chega um vendedor do seu lado e faz aquela famosa pergunta:

"Posso te ajudar?"

Eu já trabalhei no comércio e garanto que de cada 10 respostas para esta pergunta, 11 são:

"Não, obrigado, estou só olhando."


O processo normal de compra dificilmente é do tipo "pá-pum". Na maioria das vezes, o cliente não sabe responder como o vendedor pode ajudá-lo. O cliente nem sabe se quer comprar! A gente forma a idéia de comprar algo devagarzinho.

Até seria possível ficar horas discutindo se existem compras de impulso ou não. O conceito de compra por impulso é válido. Mas, sinceramente, você está careca de saber que na ponta da gôndola do caixa do supermercado sempre tem bala, chocolate, gilete, pilha e escova de dente, não?


No marketing, uma das regras de ouro é repetição. Exponha o sujeito a seu produto quantas vezes o orçamento permitir: uma hora ele compra. Funciona assim no marketing off-line, deveria funcionar também no on-line.

No entanto, quando há tempo livre para fazer umas pesquisas na Internet, dificilmente a gente consegue ter no on-line o mesmo comportamento de entrar numa loja e ficar só olhando. Se houvesse um vendedor para lhe perguntar o que você está fazendo no site dele, seria um bocado difícil responder "Estou só olhando as páginas".

Para ficar só olhando as mercadorias expostas numa loja, é preciso sentir-se, no mínimo, à vontade. E quando se consegue ficar à vontade dentro de um site?! Veja:

- É difícil se situar dentro dos sites e sempre existe o medo de dar um clique e entrar numa seção de onde nunca mais se consegue sair. Quando a gente está numa loja, ergue-se a cabeça e sabe-se na hora onde é a entrada e onde é a saída;

- A gente mal pisa o pé dentro de um site e já tem um vendedor pedindo cadastro. Às vezes você até concorda em dar o cadastro, porque o site lhe promete mostrar algo a que antes você não teria acesso. Mas se um vendedor de loja pedisse para que você lhe informasse seu CPF na porta da entrada, você informaria?


- Quando a gente entra numa loja só para olhar, não se pede à vendedora para descer toda a prateleira de produtos. Você dá uma olhadinha nos preços - se eles estiverem afixados no produto; se não tiverem, você nem pergunta -, dá um giro rápido pela loja e sai.

Mas quando você entra num site, logo lhe oferecem na home page todo tipo de oferta, mostram as opções de pagamento, a política de entrega, todos os certificados de segurança e aquele campozinho para você efetuar o login e comprar tudo o que já pôs dentro do carrinho de compras. Sinceramente, dá medo!

É excitante ficar imaginando o que a Internet tem de diferente da vida. Mas é bem mais proveitoso descobrir o que a vida tem que funciona na Internet.

Deixar o cliente passear pela sua loja funciona no mundo real. Então, é importante reconhecer que o direito do usuário de ficar "só olhando as páginas" de seu site funciona também.
Quem tem comércio sabe que estabalecer relacionamento com o cliente não é algo que acontece de uma hora para outra. Hoje em dia, há muita pressão para se oferecer relacionamento ao usuário já a partir de seu primeiro clique. Você pode até não ter implantado o CRM no seu site. Mas pega mal à beça se você já não estiver pensando no assunto.
Só que relacionamento, na verdade, não parte da vontade da gente. Parte da vontade do cliente. Então, quando o usuário chegar no seu site, não o recepcione como quem diz:

"Ei, usuário! Pare de ficar olhando página por aqui, ok?! No meu site a coisa é assim, a gente vai logo ao que interessa: o que você vai comprar? Audiência só serve se puder ser monetizada, tá bem?! Então, aproveite e vá logo me dando seus dados, porque de agora em diante eu vou ficar enviando a você E-mails só com ofertas exclusivas!"


Pelo contrário, recepcione o usuário que vem pela primeira vez a seu site de uma forma não intrusiva, deixe ele dar uma espiada, ofereça uma visão geral do que o site pode fazer por ele. E seja simpático: se o usuário pôde passear pelo seu site sem ser incomodado, quando ele for incomodado em outro site vai se lembrar de voltar ao seu.

Quando ele retornar, saiba que já é alguém com um pouquinho mais de experiência sobre seu site. Ele talvez queira se aprofundar nos níveis de conteúdo, tanto quanto poderia querer perguntar um detalhe sobre uma mercadoria que viu na prateleira da loja.
E quando ele já sentir confiança suficiente em você, no que você pode lhe oferecer, talvez ele decida por lhe contar como se chama e onde mora. Talvez ele queira, agora, relacionar-se com você.
Então, se este usuário abrir um conta de E-mail em seu site, não deixará a conta inativa. Se assinar uma newsletter, não a cancelará logo no primeiro envio. Se puser mercadorias no carrinho de compras, não desistirá antes de digitar o número do cartão de crédito.
Relacionamento a gente tem com quem interessa. E nem toda a audiência de seu site pode ser interessante. Você também não pode perder a chance de atender alguém que chega a seu site assim, como quem não quer nada. Mas apenas entenda que este tipo de usuário, que vem pela primeira vez ou raras vezes a seu site, precisa zanzar muito por suas páginas antes de lhe dizer de bom grado nome, E-mail e CPF.


(Normalmente, concluo meus artigos informando o endereço dos sites comentados. Este artigo fugirá à regra, porque não me recordo de um site brasileiro onde você possa realmente ficar olhando páginas sem se perder, sem ser importunado por solicitações de cadastro ou sem receber na homepage um turbilhão de informações. Se você tiver um em mente, envie-me a URL por e-mail. Podemos avaliar o site juntos.)